sábado, 14 de abril de 2012

A sociedade brasileira, a educação e a hipocrisia.

Eu tinha prometido que não ia dar asas a esse absurdo, mas não consigo ficar calada. Sou professora há anos da Escola Municipal Cecília Meireles, aqui de Juiz de Fora. Uma escola reconhecida pela excelência de seu trabalho, com premiações diversas, inclusive premiação internacional.
Uma escola que tem passado com excelência pelas avaliações propostas pela politica nacional de educação, com alto d
esempenho no ideb, por exemplo (deixando de lado aqui minhas reservas quanto a modelos e objetivos dessas avaliações) .
Uma escola em que a leitura e a literatura fazem parte do cotidiano dos alunos. Meus alunos do sexto ano lêem Julio Verne, João Ubaldo Ribeiro, Victor Hugo, Drummond, Quintana, Leminski...
Uma escola com uma biblioteca funcionando e que faz inveja a muitas escolas particulares.
E hoje nosso trabalho foi totalmente desconsiderado numa reportagem tendenciosa que não buscou saber da contextualização do trabalho motivador da notícia.
Na nossa escola trabalhamos com gêneros literários diversos, dentre eles a crônica, a qual tem como uma de suas características principais a ficcionalização da realidiade, o discurso próximo da coloquialidade, num misto de jornalismo e ficcção. Um gênero em que a linguagem deve ser uma das marcas do fato, da cena em narração.
E quando efetivamente nossos alunos produzem crônicas, e não textos artificiais, é isso que recebemos?
Trabalhamos com o acervo que o próprio governo nos manda e, portanto, em nossas estantes, graças a Deus, temos o melhor da literatura brasileira e os grandes clássicos. Nas nossas estantes temos Rubem Fonseca.
E quando abrimos espaço para discutir, através de normas e variações linguísticas, o processo de violência simbólica que perpassa as relações humanas na contemporaneidade, somos assim tratados?
Nós não nos negamos a mostar os textos, tanto que a reportagem os filmou.
Tenho tanta tranquilidade com meu trabalho nessa escola que quando entrei em sala hoje à tarde e fui conversar com os alunos sobre a reportagem, as palavras que mais ouvi deles foram audiência e covardia.
Essas palavras só me provam que o nosso trabalho está no caminho certo.
Eles estão sabendo assitir à TV e entender a palavra manipulação.
Que nós professores continuemos assim.
A propósito, no vídeo exibido pela net, não vi a defesa da diretora e do professor. Por quê
?
megaminas.globo.com

Fernanda Meireles  14/02/2012

11 comentários:

  1. Bote hipocrisia nisso. As crianças assistem a todo o tipo de programas na tv, ficam o dia inteiro na Internet (não só fazendo pesquisas escolares, como a gente sabe) e ninguém se preocupa com os conteúdo veiculados nesses lugares.
    Agora, chega um professor, propõe uma atividade (totalmente contextualizada) e alguns pais de alunos e os jornais caem matando em cima. Por causa disso, muitos professores só ficam no que o livro apresenta, e sabemos que muitas vezes o livro é incompleto e não apresenta todas as possiblidades de trabalho de um assunto.
    Mas sabe como é, né? O professor está sempre errado.

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  2. Triste é ver que além da falta de profissionalismo no jornal ao levantar uma polêmica de maneira superficial e prolixa e ainda chamar profissionais que não possuem condição ou autoridade para falar sobre o assunto. Profissionais que trabalham em escola que além de não ter biblioteca decente possui problemas muito mais sérios do que o pseudo problema levantado pela reportagem.
    Gregório de Matos estava certo: "quem mais limpo se faz, tem mais carepa".

    Mais uma vez sociedade e pais de alunos querem fazer o trabalho do professor. Estudamos, nos formamos, matamos um leão por dia para educar crianças e jovens, e pessoas sem um terço de nossa formação acham-se capacitadas para opinar sobre algo que elas desconhecem.

    A educação no Brasil está cada vez mais falida porque tem gente demais querendo educar. E o professor, o único capacitado para isso, tem que ficar dando satisfação do trabalho sofrido e pensado que realiza.

    Em um país que aceita tanta coisa, em uma sociedade que releva outras mais, ver indivíduos incomodados com textos literários inspirados em grandes autores como Rubem Fonseca é de ter vergonha, vergonha!


    Machado de Assis é que estava certo! Certíssimo!!!

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  3. Ju, infelizmente esse é o Brasil que nós professores, todo dia, lutamos para mudar. Eu começo a me sentir dando murro em ponta de faca. Eu falo que professor de Português passa pelo mesmo que passam os técnicos da seleção brasileira. Da mesma forma q todos acham que têm autoridade para dar palpite em escalação e tática, a maioria acha que, porque fala português, pode se meter no nosso trabalho. Vão estudar o tanto que nós estudamos,depois venham falar conosco de igual pra igual.

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  4. Depois do comentário da Juliana, sem mais a acrescentar!! Lamentável!!

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  5. Rubem Fonseca nao é literatura para alunos de nivel fundamental.

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  6. Uma palhaçada essa reportagem. O que a gente vê, cada dia mais no Brasil, é essa mentalidade que todo mundo sabe mais do que os professores, é muito triste ver como o professor é desvalorizado e colocado abaixo dessa maneira. A escola deve ser, obviamente, o local da educação, mas a educação é construída no diálogo, no debate, não nesse puritanismo falso.
    Todo mundo sabe o que é melhor para a educação, mesmo assim a educação é o que mais falta por aí. (Se bem que acho que se trata mais de esclarecimento, no caso)
    Muito lamentável.

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  7. O autor-base do trabalho não foi Rubem Fonseca, foi Carlos Eduardo Novaes. Eu apenas disse que em nossas estantes lá está o Rubem Fonseca, legitimando toda uma linha da literatura contemporânea brasileira, que, caso esse tipo de falso moralismo continue dando frutos, estará ausente de nosso trabalho. Então esse tipo de autor não pode, mas certos programas de televisão que vivem da violência, certas músicas, etc, isso pode. Dá-lhe hipocrisia!!

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  8. Sétimo ano do ensino fundamental? Acho bem delicado trabalhar os textos do Rubão nessa idade.

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    1. É impressionante a capacidade de exercitar a hipocrisia em nossa sociedade. Não acredito em nenhum momento que Rubem Fonseca ou Carlos Eduardo Novaes (ou Nelson Rodrigues) sejam "fortes demais" para crianças do Ensino Fundamental. Acredito menos que os pais estão verdadeiramente procupados com isso. Se estivessem, permitiriam que seus filhos assistissem à novelas que exploram de modo incansável o sexo e a violência? Continuariam acompanhando o jantar com programas de jornalismo sensacionalista?
      Também sou professora e concordo plenamente com os comentários acima. E sinto-me envergonhada.

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  9. NINGUÉM TRABALHOU OS TEXTOS DO RUBEM FONSECA!! O autor trabalhado foi Carlos Eduardo Novaes. O Rubem Fonseca foi só um exemplo do que pode nos esperar!! Vou ter que repetir???

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